mardi 12 décembre 2006

Corpo de Bicho

Foram cantos célebres, risadas, ensaios e cegueiras.
Soluços, quebras, bloqueios e janeiras.
De dentro para fora, de fora para dentro!
Bloqueios célebres, curtas frases sem pontos, fios, poucos, finos.
Portas pequenas, janelas redondas deitadas.
Falando com elas, de fora para dentro!
Estúpida criança que vai e que volta, de dentro para fora de fora para dentro!
Não voltes criança, não venhas, vai e fica lá fora, lá dentro!

Foram cantos, risadas, ensaios e cegueiras.
Cantos lá fora, cantos cá dentro, cantos quadrados de casas.
Adentro vergados cantos de canos de casas lá fora.
Cantos e cantares, ouço-os.
Muitos cânticos, resmungo orando, ouço-os.


Foi um canto, um ensaio e duas cegueiras.
Ela canta pouco, fala pouco, muda, ouço-os.
Que canta ela, pouco, muda, desnuda?Ouvimo-la!
Se desnuda, muda.Ouvimo-la!
Libertou corpo, pele, nos cantos, no quinchoso! Na muda desnuda tornou-se Bicho!

Uma apenas.
Bichos dos bichos, voou! Grita, muda, do alto da penumbra! Pele desnuda, corpo de bicho, bicho de bicha, mudo... desnudo, cantos canta!
Voa, muda, pele de bicho, canta.
Desnuda, mudo, canta, bicho de bicha, bicho de fila, bicha de banca, fila de peixe, peixe escama, pele de bicho, bicho voa, corpo mudo vivo desnudo canta.

João Velho (1906)